Raphael Muchiutti Picacio

Consciência crítica e generosidade!

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Servidor Público efetivo, o advogado pós-graduado, Raphael Muchiutti Picacio há alguns anos milita em defesa de animais. Natural de Marília-SP, hoje vive em Uberaba com seus 6 cães e tem uma experiência valiosa com ONGs de proteção animal, além do conhecer muitos Centros de Zoonoses. Tem uma visão ampla e bem fundamentada da realidade desse segmento em Uberaba, tanto do ponto de vista das ONGs quanto do poder público. E o principal: tem uma consciência crítica que aliada à sua generosidade o torna um ser humano admirável.

 

“Em um município de quase 340 mil habitantes seria necessário castrar no mínimo uns 4000 mil animais por ano”

 

Marcos Moreno- Você não é de Uberaba. Quais os motivos que o trouxeram para cá?
Raphael Muichitti Picacio– Sou natural de Marília SP, minha família veio para Uberaba no ano de 1991 em função do meu pai ser servidor público do Estado de Minas Gerais. No ano de 2011 até cheguei a mudar para Votuporanga SP, mas em 2012 fui convocado para tomar posse em cargo público na Prefeitura Municipal de Uberaba.

Marcos– Com relação ao cuidado- envolvendo tempo trabalho, etc- com os animais, em que categoria você se sente mais confortável? Protetor Independente, voluntário…?
Raphael– Acho que na vida tudo muda, já cheguei a dedicar 3 horas diárias durante toda a semana para cuidar de animais abandonados, posteriormente, quando fui assessorar a vereadora Denise da SUPRA, trabalhava várias horas por dia com a causa animal. Hoje em dia me enxergo como protetor dos animais e voluntário da SUPRA.

Marcos– Toda pessoa simpatizante da causa animal não esquece o momento ou a situação que a despertou para essa atividade. Qual foi o seu momento?
Raphael– Essa questão de “despertar” é complexa, na verdade ainda hoje posso dizer que não estou 100% “desperto” para a causa animal, vou explicar.
As experiências que temos na vida, as reflexões filosóficas, os livros que lemos, filmes, etc. ajudam a formar quem somos assim como a genética. Gostar de animais eu sempre gostei, agora, quando eu resgatei o meu cachorro Idi (em 2009) eu comecei a despertar para a péssima situação dos animais abandonados e em paralelo com isso a maldade de alguns humanos. O Idi foi abandonado, sem água e nem comida, ainda bebê, no meio de uma estrada de terra distante 15 km da cidade de Iturama MG, ele ficou tanto tempo no sol que quase morreu e teve suas retinas queimadas pelo sol, ou seja, desde pequeno ele é cego.
Com esse fato eu comecei a dar mais atenção aos animais como um todo, mas ainda acho que tenho de “despertar” em vários sentidos, uma questão mal resolvida ainda por mim é no tocante ao vegetarianismo, ainda não despertei para isso e tenho questionamentos que sempre me atormentam.

Marcos– Você tem experiência de trabalho em ONGs?
Raphael– Sim, tenho experiência tanto na SPAVO uma ong da cidade de Votuporanga/SP onde fiz resgates, feiras de adoções, reuniões com políticos, etc.
Agora, a minha maior experiência foi na SUPRA onde eu atuo como voluntário desde o ano de 2012.

Marcos– Você conhece várias ONGs, pode citar algumas que sejam modelos?
Raphael– É complicado falar em “modelos”, é lógico que existem ONGs que são “perfeitas”, como a APA de Uberlândia, mas isso depende de inúmeros fatores como: fonte de custeio dos gastos, administração, número de animais que a ONG possui, etc. Outro fator importante é que nem sempre uma “ONG” dita como modelo vai ser “modelo” em todas as suas atitudes, um exemplo disso foi o que ocorreu comigo no ano de 2014. Nessa época, eu procurei uma “ONG” modelo que existe no interior do Estado de São Paulo para buscar conhecimentos para melhorar a situação administrativa da SUPRA, foi então que a diretoria da mencionada ONG disse para mim que a visita sairia R$180,00 reais, na hora eu até perdi a voz, achei entranho essa posição. Eu não buscava conhecimento para gerar dinheiro para mim, eu buscava informações para melhorar a situação dos animais abandonados em Uberaba e resgatados pela SUPRA.
Como se vê, é uma ONG “modelo” que não pensa nos animais.

Marcos– Muitos abrigos são considerados uma “bomba relógio”. O que isto quer dizer?
Raphael– Essa questão é bem complexa e perigosa, algumas das pessoas que lidam com animais abandonados não conseguem equacionar a quantidade de animais que possuem com a qualidade de vida que eles podem dar para esses animais. É lógico que são duas variáveis bem subjetivas que cada “protetor” tem de analisar, entretanto, existem algumas pessoas que passam do limite em quantidade de animais e viram acumuladoras. Isso é um perigo, primeiro porque vai gerar inevitavelmente casos de maus-tratos e em segundo lugar, caso essa pessoa morra ou fique doente pode não existir “plano B” para socorrer ou dar a destinação para os animais.
Os órgãos de fiscalização devem acompanhar essa situação estabelecendo limite na quantidade de animais. O Centro de Controle de Zoonoses, o CRMV-MG e o MPMG, devem atuar nesse lado também, não só no caráter instrutivo, mas também providenciando o cumprimento da “Legislação” pois “a saúde é direito de todos e dever do Estado” e animais abandonados é caso de saúde pública.

Marcos– Você também conhece Centro de Zoonoses em pleno e satisfatório funcionamento. Onde?
Raphael– Sim, conheço alguns. O melhor, sem sombra de dúvidas, é o de Piracicaba/SP. Também conheço os CCVs de Votuporanga, Barretos, Ribeirão Preto, São Jose do Rio Preto. Na época em que conheci o CCZ de Piracicaba eu percebi o quanto que o Município de Uberaba está atrasado nas políticas públicas referentes à “causa animal” e consequentemente à “saúde pública”.
O CCZ de Piracicaba/SP, em especial o canil/gatil de lá, possui 14 veterinários lotados e uma estrutura impressionante.
Fazendo uma comparação com o CCZ de Uberaba fica estarrecedor a diferença, tanto assim o é que o CCZ de Uberaba, em especial o canil, já foi denunciado no CRMV-MG e o MPMG, sendo que nesse ultimo a PMU teve que fazer ate um Termo de Ajustamento de Conduta, e mesmo assim está bemmmmmmm longe do razoável.
Não estou exagerando não, o CCZ de Votuporanga/SP tem a mesma estrutura, a mesma quantidade de funcionários que o de Uberaba, a diferença é que Votuporanga/ SP tem 94 mil habitantes e Uberaba tem 330 mil habitantes, ou seja, o CCZ de Uberaba, no que se refere ao canil/gatil existe só para falar que tem.
A Prefeitura Municipal de Uberaba vem “enxugando gelo” nesse ponto faz décadas e não anos.

Marcos– O bom funcionamento de um CZZ passa pela questão política?
Raphael– Sim, isso depende 100% do Poder Executivo. É lógico que os órgãos de fiscalização devem cobrar do Município providências, já que ele não faz por si só, mas no Brasil existe sempre um “vou empurrando com a barriga” de todos, principalmente do Poder Executivo.
Veja bem, outro exemplo de que Uberaba está muito atrasada em políticas públicas voltadas para os animais.
Desde o ano de 2011 o município de Votuporanga/SP promove diversas castrações gratuitas em cães e gatos, machos e fêmeas. Em 2011 eram castrados 1000 mil animais por ano, esse número vem crescendo a cada ano, hoje eles castram 1800 no período de 12 meses.
Em Uberaba, há vários anos não existe castrações feitas pelo Município de Uberaba. Recentemente houve uma licitação para castrar 360 animais em 6 meses…. isso é uma piada de mal gosto.
Em um município de quase 340 mil habitantes seria necessário castrar no mínimo uns 4000 mil animais por ano.
A Prefeitura Municipal de Uberaba, no que diz respeito à causa animal, não chega nem em “enxugar gelo”.

Marcos– Tenho informação que a FGV desenvolveu um estudo para o CCZ de Uberaba. Por que isso não foi levado a cabo? Ou foi?Raphael– Na verdade a FGV fez um trabalho de reestruturação do executivo municipal, nesse estudo houve a criação da Superintendência do Bem-Estar Animal. Essa superintendência teria várias competências ligadas à “causa animal”, principalmente no tocante as políticas públicas. A reestruturação do Canil do CCZ seria uma vertente disto. Entretanto, nada ocorreu e o Canil do CCZ foi denunciado no MPMG gerando um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) para reformar o CCZ.                                                                 52181496_644117039343009_3317323183404613632_n

Marcos– Você foi nomeado Superintendente do Bem Estar Animal de Uberaba, função criada pela PMU. Não é mais?
Raphael– Sim, fiquei nomeado por alguns meses, mas já estava bem cansado de não ver resultados práticos na causa animal. É uma atividade bem complicada lidar com sofrimentos diários de animais abandonados e não ver resultados práticos. A mentalidade de alguns políticos não muda. Então decidi desistir do cargo comissionado e voltar para o meu cargo efetivo mesmo. Foi a melhor decisão que tomei naquele ano, a pressão saiu dos meus ombros.

 

“…a cultura/educação é definitivamente influenciadora na população de animais abandonados”

 

Marcos– A cultura de um local tem influência da população de animais abandonados?
Raphael– Sim, a cultura/educação é definitivamente influenciadora na população de animais abandonados. Aonde falta tudo, inclusive educação a última coisa que a população se preocupa é com os animais.
Isso fica nítido em bairros mais pobres onde a população de animais abandonados é maior.

Marcos– Tenho visto, pelas redes sociais, muita manifestação contra a castração química em animais de rua na cidade de Uberaba. Você é a favor?
Raphael– Sou totalmente contra, é um método totalmente duvidoso em vários sentidos. A castração química não deve ser utilizada por órgãos públicos, seria um desrespeito com o dinheiro público, custa caro e não resolve definitivamente o problema da proliferação de animais abandonados.

Marcos– Sempre peço para o meu entrevistado deixar uma mensagem para os homens em relação aos animais. Pode ser?
Raphael– Legal, existem várias frases sobre os animais, mas existe uma que é a minha predileta.
“Receio que os animais considerem o homem como um ser da sua espécie, mas que perdeu da maneira mais perigosa a sã razão animal, receio que eles o considerem como o animal absurdo, como o animal que ri e chora, como o animal desastroso.” – Friedrich Nietzsche
É uma frase que possui várias interpretações dependendo do ponto de vista… em suma, os animais nos acham um “desastre”.

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