Raphael Muchiutti Picacio

Projeto Casinhas!

Temos visto em redes sociais, postagens de uma pessoa fazendo e distribuindo em diversos pontos da cidade de Uberaba-MG Brasil, casinhas de madeira para servirem de abrigo para cães de rua, cães comunitários ou eventuais frequentadores de determinados locais em busca de abrigo, especialmente nessas noites frias. Para gatos também. Rastreando chegamos ao dr. Raphael Muchiutti Picacio, que já foi nosso entrevistado aqui no blog há bastante tempo.
Advogado pós-graduado desde 2007 e servidor público municipal efetivo no cargo de Analista de Direito, lotado na Superintendência de Bem-Estar Animal da SEMAM (Secretaria do Meio Ambiente), tem ainda como relevância para o trabalho que faz, o recente curso feito pelo Instituto de Medicina Veterinária do Coletivo: Capacitação para a gestão do Manejo Populacional. O trabalho chamou atenção da mídia, de um modo geral. Claro que outras pessoas, civis ou políticos, que são engajadas na causa animal já criam ações para a proteção dos animais de rua. Mas o que mais impactou no trabalho empreendido pelo Raphael foi a dinâmica do reaproveitamento, a criatividade a existência clara da real preocupação com os bichos, a agilidade e o “time”, que de tão preciso certamente evitou a morte de muitos animais por hipotermia.


“…depois de tanto tempo entregando casinhas, ainda não virou projeto”

Marcos Moreno– A pergunta básica: como surgiu a ideia desse projeto?
Raphael – Eu sou o projeto, muito prazer…kkkk. Foi uma necessidade que eu visualizava nos cães tomando chuva e passando frio. A protetora Andressa, sogra do vereador Caio Codoi disse que a empresa Maqnelson teria caixas de madeiras para doar, e que essas caixas serviriam para animais de rua. Fui lá a primeira vez no ano passado e depois disso virei freguês em pedir casinhas para os cães. O pior é que depois de tanto tempo entregando casinhas ainda não virou um projeto, tudo vai acontecendo de acordo com o possível, ferramentas, parafusos, o próprio engate para colocar no carro da prefeitura, entregas das casinha, aquisição de novas casinhas na Maqneldon, etc. Tudo ocorre sem planejamento ou ajuda.
A PMU só entra com o carro e com o meu salário de servidor efetivo. Até o papel dizendo que se trata de uma casinha de um cão ou gato comunitário impresso com o brasão da Prefeitura Municipal de Uberaba sou eu que imprimo na minha casa fora do expediente.


Marcos Moreno-Como funciona a logística para distribuição das casinhas?
Raphael- a Logística também sempre ocorreu de modo atabalhoado. Antigamente eu sempre tinha de trocar de carro na PMU porque o nosso carro é um Gol 2018. Eu sempre fazia troca por outros carros pick. Isso atrapalhava muito, por isso recentemente eu paguei do meu bolso mesmo a instalação de um engate no Gol da Superintendência, aí pelo menos a logística melhorou bastante, já que possuo uma carretinha onde consigo colocar até 3 casinhas montadas. No tocante as entregas eu priorizo os cães de rua em maior quantidade, logo após isso os cães e gatos comunitários e depois para animais de pessoas de bairros pobres.

Marcos- Por que a população de animais abandonados é tão crescente em Uberaba?
Raphael- Por que simplesmente Uberaba não castra nada, e quando castra não faz nem 15% do necessário por ano.

Marcos- Você é funcionário público municipal e trabalha na Superintendência do Bem Estar Animal. O que é estabelecido como seu trabalho profissional?
Raphael- Meu trabalho é verificar as denúncias de maus tratos, e ajudar o dr. Sergio nos pedidos de ajuda. Mas o que parece simples pode ser extremamente complexo, se o caso for grave pode durar quase que um dia todo para se resolver.
Os pedidos de ajuda seguem o mesmo estilo, às vezes é algo simples, às vezes temos de voltar no mesmo lugar ate 6 vezes para acompanhar o tratamento do animal.
Um exemplo disso é o bairro de Peirópolis que virou posto de abando de animais, quase toda semana estamos lá para ajudar animais doentes.

Marcos- Como pessoa física, você se envolve com a causa e acaba trabalhando muito mais e sem interrupção. Como você estabelece limites para uma coisa e outra?
Raphael- Só estabeleço limite quando desligo o celular, se eu não fizer isso são mensagens durante todo o dia, inclusive de pessoas que deveriam saber que o horário de serviço é das 8h as 18h de segunda-feira a sexta-feira. Esse serviço é extremamente desgastante e por isso sempre procuro ajuda dos meus médicos e dos meus amigos para desabafar. Além de vivenciar os maus tratos diariamente e às vezes presenciar óbitos dos animais, ainda existem as questões administrativas e politicas da PMU que só prejudicam o animais.

“…estamos sofrendo um PAD na PMU por conta de uma viagem…”


Só para você ter uma ideia, eu e o dr. Sergio estamos sofrendo um PAD na PMU por conta de uma viagem que fiz para Votuporanga para comprar Xilazina e Ketamina. Fiz a solicitação pelo fato de que não estávamos encontrando os medicamentos na região, paguei do meu bolso R$170,00 para adquirir os remédios, não pedi reembolso pela gasolina gasta e fui no sábado e voltei no domingo. A única exigência que o veterinário amigo meu que vendeu as medicações fez era de que a venda somente poderia ser feita para outro veterinário. Foi então que dei o nome do dr. Sergio e seu número no CRMVz.
Passado um mês da viagem fiquei sabendo que estava sendo processado porque “ligaram” no local (clínica veterinária) e perguntaram se lá vendia Xilazina e Ketamina, nesse caso é lógico que obtiveram a resposta negativa, dai para frente abriram o processo. O problema é que a clinica não vende essa medicação para QUALQUER pessoa. Quem ligou tinha que se identificar como veterinário. Esses dois medicamentos são de uso restrito de veterinários e a Ketamina ainda pode ser utilizada para fabricação de droga. Ninguém sai vendendo isso facilmente.
De qualquer forma tenho as provas necessárias testemunhais e documentais para provar tudo. Mas o mais engraçado é que em nenhum momento a SEMAM me pediu nota fiscal ou até mesmo a visualização dos medicamentos, eles simplesmente abriram o processo. Depois não adianta falar que não existe assedio moral e perseguição na Prefeitura, mas o meu advogado e o MPMG já foram informados da situação e estamos esperando os próximos atos da PMU.

“…o mais importante é castrar, castrar e castrar…”

Marcos- Para deixar claro pergunto mais uma vez aqui nesse espaço: o que é de responsabilidade do município na questão animal?
Raphael– A responsabilidade do Município vem daquilo que é determinado pelo Legislativo, é simples assim. Agora se fossemos ver aquilo que está previsto nas “Leis” o município não teria “pessoal” e nem “dinheiro” para fazer tudo. Por isso o mais importante é castrar, castrar e castrar! Se fizer isso dessa forma daqui uns 7 anos Uberaba será modelo na causa animal, podendo destinar recursos e forças para outras áreas como fiscalização de maus tratos, educação nas escolas, hospital veterinário público, e diminuição e quem sabe ate desativação das ONGs. Antes que venham me matar, NÃO SOU CONTRA AS ONGs, só acho que tudo não é eterno e até mesmo “as donas” desses abrigos vão morrer um dia, aí queria saber quem vai assumir as “bombas”. Porque a verba para ração existe, mas elas nunca param de pegar animais e sempre estão com dificuldade financeira. Se a PMU começar a castrar uns 8 mil cães por anos logo isso acaba.

Marcos- As ONGs que existem em Uberaba estão capacitadas para receber e tratar de tantos animais?
Raphael- Não, não estão! Todas as duas ONGs da cidade não estão cumprindo os termos de compromisso de quantidade máxima de animais que elas podem ter. Se no convênio fala que o máximo de animais será 700, pode ter certeza que já passou de 1000. No mesmo lugar você encontra situações onde o animal estaria melhor na rua do que dentro de um cubículo as vezes apanhando de outros cães por disputa de território. Ai você aumenta a ONG para não ter essas brigas, e os responsáveis conseguem “achar” mais cães que “necessitam” de abrigo. Para mim isso é mais acúmulo do que amor. As ONGs deveriam ter meta de doação e também deveriam catalogar os animais. Falo isso pq existem alguns animais que nascessem, crescem e morrem lá dentro, sem nunca ter pisado na grama, isso é muito triste.

Marcos- Falou-se tanto dos castra-móveis em Uberaba. Estão funcionando? Existe algum planejamento para que funcionem?
Raphael- Castramóvel sempre foi panfletagem política, não é à toa que antes das eleições era foto para todos os lados, depois foi só conversa de “burocracia”, falta de insumos, profissionais especializados, etc. Para você ver o tamanho da falta de gestão temos 3 castra móveis prontos para funcionar e mais um ambulatório que falta ainda uns 90% para funcionar. A culpa disso tudo é tanto da gestão anterior como dessa. É claro que o governo anterior é o maior culpado, “fez” tudo por cima, mas pelo menos começou , mas também não fez à toa, ambulatório e castra móvel dão votos.
No caso do castra móvel foi até engraçado. Uberaba já tinha dois, inclusive um do MPMG muito bom, mas um certo deputado federal da cidade que começou a “adorar” animais fez outro castra móvel bem perto das eleições e ainda elegeu uma vereadora defensora dos animas. Ou seja, é tudo jogada, muito melhor destinar verbas para insumos e equipamentos para o ambulatório ou para a zoonoses, mas isso não daria voto né?

Marcos- Você conhece alguma cidade que sirva de exemplo na questão da causa animal?
Raphael- Sim, conheço, Piracicaba- SP é um exemplo. Lá o Canil da Zoonoses é separado do resto desse órgão. A diferença é tão grande que nem tem como fazer comparação. São mais de 48 baias individuais, 20 baias de quarentena e 8 baias para casos graves. O canil possui 12 veterinários, ou seja no mínimo 5 por turno. Fora a existência de um atendimento de emergência (24h), uma espécie de SAMU dog. Lá a sala de vacinação, disponibiliza a vacina da raiva e sempre que possível as vacinas contra as demais doenças (V8). Fica mais fácil comparar o Canil de Piracicaba com HVU.
Aqui em Uberaba tudo é muito esquisito, o Canil daqui já passou por algumas reformas mas sempre tem problemas. Hoje se qualquer pessoa for lá vai encontrar tudo vazio, no máximo 3 cães e nem sei se tem gatos. A Farmácia Pet, praticamente fechou, os veterinários não fazem consulta, até onde eu sei, não existe equipamentos, não tem castrações. Até onde eu sei só são feitas eutanásias.

“os políticos começaram a notar que a causa animal dá muito voto”

Marcos- Existe uma luz no fim do túnel para essa causa?
Raphael- Lógico que existe!! Aqui em Uberaba já foi bem pior, hoje em dia já está bem melhor, antigamente tinha até veterinário efetivo que dava eutanásia em cão sadio para controle populacional. Hoje em dia o mesmo faz consulta veterinária sem por a mão no animal e pela janela vê o cão…rsrsrs, nem a temperatura do animal o cidadão mede. Só em Uberaba mesmo umas coisas dessas. No governo do Anderson melhorou um pouco, já no Piau melhorou bem mais e o ponto principal foi “os políticos começaram a notar que a causa animal dá muito voto”, ai eles ficaram doidos, procuraram saber sobre tema e até se dizendo “protetores”. Agora no atual Governo com 3 vereadores eleitos pela causa animal e com outra vereadora que toda hora fica descendo e subindo do muro com relação a causa animal tenho certeza que será melhor.
No início do atual governo a Superintendência de Bem Estar Animal foi deixada de lado, funcionando precariamente, com somente 2 funcionário, sem atendente telefônico (nesse caso deixei meu WhatsApp na telefônica da PMU), sem insumos e até com falta de gasolina, culminando no despejo sem aviso prévio feito pela SEGOV. Fora as inúmeras polêmicas políticas criada por diversas pessoas em busca do cargo de superintendente. Dizem que tinham mais de 10 pessoas para pôr no lugar…kkkkk.
Com a transferência para a Zoonoses e com a nomeação da Isa Fatima a menos de 20 dias, estamos melhorando. Outro servidor efetivo Wander foi transferido para lá e está ajudando muito e recentemente outra moça foi nomeada, Liz Vilarinho. Tanto a Isa como a Liz estão analisando a documentação da gestão passada já que não houve um processo de transição.
Ainda bem que foi só um semestre perdido nas questões de politicas públicas para os animais né? Agora sinto que os agentes públicos envolvidos de alguma forma (competência) começam a dar o devido valor a causa animal já que na última eleição forma eleitos 3 vereadores que defendem expressamente essa causa, inclusive o Chefe de Governo na Câmara. O Executivo tem de “castrar, castrar, castra e castrar”. Quando Uberaba estiver tendo umas 8000 castrações ao ano as coisas vão melhorar muito.
Existem muitas pessoas envolvida nessa causa, Caio Godoi, Alessandra Piagem, Denise Max, Isa Fatima e até a própria Prefeita Elisa. Sem contar os deputados estaduais e federais que podem ajudar Uberaba! Se com essa quantidade de gente não sair nada do papel e continuar 3 castra-móveis parados e um ambulatório pela metade a população vai fazer uma verdadeira Santa Inquisição” contra as autoridades, aí depois não adianta chorar e colocar a culpa nos outros. Isso sem contar o MPMG e o MPF que vão estar de olho!

6 Respostas

Add a Comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *